FAÇA BIODANÇA!




BIODANÇA, MEMÓRIA E VIDA



19 de abril de 2011

Adélia Prado

Antes do nome
Adélia Prado
Não me importa a palavra, esta corriqueira.
Quero é o esplêndido caos de onde emerge a sintaxe;
os sítios escuros onde nasce o ‘de’, o ‘aliás’,
o ‘o’, o ‘porém’ e o ‘que’, esta incompreensível
muleta que me apóia.
Quem entender a linguagem entende Deus
cujo Filho é o Verbo. Morre quem entender.
A palavra é disfarce de uma coisa mais grave, surda-muda,
foi inventada para ser calada.
Em momentos de graça, infreqüentíssimos,
se poderá apanhá-la: um peixe vivo com a mão.
Puro susto e terror.
http://www.germinaliteratura.com.br/adeliap.htm


Morre quem entender... Acho lindo isto pois, após a percepção de algo que estava obscuro, jamais seremos os mesmos! A compreensão, o discernimento, a ampliação da consciência é crescimento e muitas vezes, é dor também. Compreender algo é estar pronto a compreender o mundo. É constituir-se como ser que aprende. É ler o que é dito e o que não é dito. 
É reconhecer o que nos frustra e saber o que fazer com ele. A palavra é um disfarce... E, por detrás dela está o nosso desejo, a origem das coisas, o por quê das escolhas, o caminho percorrido, o ser humano que se comunica. A palavra (a atenção, o cuidado, o olhar...) dirige-se ao outro e tem o poder de reconhecê-lo como ser capaz de entender, entender-se e entender o mundo!

16 de abril de 2011

Homenagem a um anjo que virou estrela

O filme Dreams do Akira Kuroswa, me foi apresentado pela minha filha  no ano do centenario do Van Gogh, em 1989. Ela tinha 9 anos e viu o filme na escola. Compramos a fita. Vimos muitas vezes. Vou falar dele para fazer uma homenagem a uma senhora linda que se despediu hoje desta vida e com certeza virou um anjo, uma estrela que brilhará no céu sempre, como referência de vida.

O filme Dreams consta de seis ou sete sonhos, uns terríveis, assustadores, realistas demais e outros suaves, maravilhosos, esperançosos. Em um dos sonhos, o viajante entra no quadro do Van Gogh que ganha vida. Fantástico! Conversa com o artista e nos impressiona. Mas o sonho que eu mais gosto é o Povoado dos Moinhos.

Este povoado era um lugar lindo, com riachos de aguas cristalinas, sem luz elétrica, natureza em perfeita sintonia com os homens. O viajante, personagem do filme, encontra um senhor muito idoso, centenário, e ele conta que lá não tem luz elétrica, mas "para quê", pergunta o senhor. Explica que os habitantes daquele lugar vivem em sintonia com a  natureza. Quando o sol levanta eles levantam também. Quando o sol se põe eles dormem. Explica que não precisam enxergar nada de noite. Que noite é noite e se não fosse assim não teria nenhuma graça. Surge, então uma espécie de procissão. As pessoas dançavam, cantavam, faziam barulho com guizos. Estavam alegres. O viajante perguntou ao senhor se era uma festa. Ele disse que era uma procissão e explicou que lá, quando uma pessoa que viveu muitos anos morria, eles agradeciam pelo tempo que aquela pessoa passou com eles, pela contribuição que ela deu. Era uma despedida feliz por terem convivido com aquela pessoa.

Assim eu sinto. O anjo do meu prédio foi para o meio das estrelas. E ela se chama Áurea que significa coberta de ouro, que brilha no céu iluminado.

12 de abril de 2011

O laço e o abraço – Maria Beatriz Marinho dos Anjos


Você já reparou como é curioso um laço…
Uma fita dando voltas?
Se enrosca…
Mas não se embola,
vira, revira,
circula e pronto:
está dado o laço
É assim que é o abraço:
coração com coração,
tudo isso cercado de braço.
(...)
Então o amor é isso…
Não prende,
não escraviza,
não aperta,
não sufoca.
Porque quando vira nó,
já deixou de ser um laço!


Este poema é lindo! Copiei apenas umas partes para deixar aqui. Agradeço à autora que fez esta obra de arte. Uma vez, ouvi alguem dizer que o abraço dos pais com os filhos devia assim, meio aberto, meio frouxo, como se fosse uma concha, para que o filho pudesse mover-se dentro daquela concha/abraço e sentir-se livre para voltar a ela sempre que desejar. E nas relações par? Namorados, companheiros, amigos? O abraço é um acolhimento, ato de aceitar o outro, uma delícia que faz toda a diferença na relação. Mas, que seja um lindo laço e nunca um enrolado nó! Beijos e boa semana!

10 de abril de 2011

Modelo de Ajuda

Comecei o curso de Modelo de Ajuda. Foi um lindo encontro.
Um grupo maravilhoso. Pessoas de diversas partes do país.
Pessoas disponíveis para aprender como ajudar e como acolher.
Cheguei em casa, abri o livro e encontrei este poema:


Não colhe agora o botão
que,
 por si só,
promete desabrochar.
Dá seiva à roseira que,
por si só,
a rosa se abrirá num sorriso
a te oferecer
suas pétalas...
seu perfume...
Dócil e integralmente.


Claudia Myrian Botelho in Miranda, Márcio L.; Feldman, Clara. Construindo a relação de ajuda. BH: editora CEAP, 2006.Pag 34. 

6 de abril de 2011

Gratidão

Na semana passada nosso grupo Biodança, Memória e Vida, dançou e dialogou sobre o tema da Gratidão. Este grupo desenvolve atividades que auxiliam a memória e a integração social, buscando sentido para a vida diária. Toda semana iniciamos a aula com um texto ou um diálogo sobre um tema escolhido de acordo com a demanda do grupo. Na semana passada foi lindo trabalhar com o tema da gratidão! Na semana anterior havíamos trabalhado a leveza!. Gratidão é alegria, é vida, é fonte de saúde e vitalidade. Ter gratidão é abrir espaço para o novo. Implica em aceitar, perdoar e renovar a si próprio e às relações. É deixar que a luz divina entre e acolha nosso coração. Deixar que as portas e janelas abram-se e seguir em frente abraçando a vida.
Ao falar em gratidão é impossível deixar de trazer alguns fragmentos do livro de André Comte Sponville, Pequeno Tratado das Grandes Virtudes e junto com ele minha gratidão pela vida! Com base nas leituras que fiz deste livro e nos sentimentos gerados à partir de nossa última aula vai aqui uma reflexão. Espero que gostem!
Sponville nos diz que a gratidão é uma virtude agradável, pois todos nós preferimos muito mais ganhar um presente a um destrato. Mesmo é uma virtude complexa, pois com ela vem o mérito de termos vencido um obstáculo. A virtude está ligada à generosidade e esta se opõe e supera o egoísmo. A gratidão é diferente da generosidade, pois não dá nem recebe. Assim sendo, não há perda na gratidão.

No entanto, ele pergunta: se a gratidão nos falta com tanta frequência, não será, de novo, mais por incapacidade de dar do que de receber, mais por egoísmo do que por insensibilidade? (p.103)

Sponville afirma que o egoísta é ingrato, pois ele se regozija com o que recebe e não com o que ele dá. A gratidão é generosa, pois é um eco de alegria e dá a si mesma! (p.104)

 A gratidão é dom, a gratidão é partilha, a gratidão é amor: é uma alegria que acompanha a ideia de sua causa, como diria Spinoza, quando essa causa é a generosidade do outro, ou sua coragem, ou seu amor. Alegria retribuída: amor retribuído. (p.104)
O autor diferencia gratidão da ingratidão, pois a gratidão sabe ver no outro a causa de sua alegria. Há humildade na gratidão (p.104) porque ela sabe que não é sua própria causa, nem seu próprio princípio (p104).

Nós somos partes do planeta, do cosmo. O que acontece o planeta se reflete m nós. O que fazemos com o nosso ambiente próximo se amplia em grande escala. O autor confirma nossa relação de interdependência com o cosmos e nos convida a agradecer pelas menores coisas, pelo simples fato de existir. 

Como não agradecer ao sol por existir? À vida, às flores, aos passarinhos? Nenhuma alegria seria possível para mim sem o resto do universo (pois, sem o resto do universo, eu não existiria). É nisso que toda alegria, mesmo puramente interior ou reflexiva (a acquiescentia in se ipso de Spinoza), tem uma causa externa, que é o universo, Deus ou a natureza: que é tudo. Ninguém é causa de si, nem, portanto (em última instância), de sua alegria. Toda série de causas, e há uma infinidade delas, é infinita: tudo se amarra, e nos amarra, e nos atravessa. Todo amor, levado a seu limite, deveria, pois, tudo amar: todo amor deveria ser amor a tudo (quanto mais amamos as coisas singulares, poderia dizer Spinoza, mais amamos a Deus).(p. 104)
Sobre a relação com o passado ele diz: a gratidão (charis) é essa alegria da memória, esse amor do passado – não o sofrimento do que não é mais... (107) Assim, a gratidão não anula o luto, mas lida com ele de forma diferente.

Faço um parêntese para comentar um dos sonhos de Kurosawa (Filme Dreams) chamado Povoado dos Moinhos. Há a cena de um enterro e uma procissão alegre, cheia de guizos, música e flores. O viajante pergunta ao senhor idoso se aquilo é uma festa. Ele explica que é um enterro e que quando alguém morre  eles agradecem por aquela pessoa ter vivido ali, ter sido quem foi e por sua contribuição à vida de todos. É a gratidão pelo que foi, tão difícil muitas vezes para nós, que queremos prender em nós aquilo que na realidade precisa se desprender.

Fato muito comum em nossa cultura é o agradecimento para evitar problemas, para ganhar favores entre outros, enfim, a bajulação!  Sponville afirma que gratidão não é complacência não é corrupção e reflete sobre a possibilidade de o próprio reconhecimento ser servilidade disfarçada, egoísmo disfarçado, esperança  disfarçada!  

Ao final do texto, autor  define a gratidão como uma virtude de fato pois é  originária do amor.   “A amizade conduz sua dança ao redor do mundo”, dizia Epicuro, “convidando todos nós a despertar para dar graças.” Obrigado por existir, dizem um ao outro, e ao mundo, e ao universo. Essa gratidão é de fato uma virtude, pois é a felicidade de amar, e a única. (p.108)
SPONVILLE, André Comte. Pequeno Tratado das Grandes Virtudes. São Paulo: Editora Martins Fontes, 1999.